José Lins do Rego
José Lins do Rego Cavalcanti nasceu em 3 de julho de 1901, no engenho Corredor, na Paraíba, onde passou a infância. Fez o curso secundário em João Pessoa. Em 1918, muda-se para Recife, matriculando-se, no ano seguinte, na Faculdade de Direito. Nesse tempo, trava amizade com José Américo de Almeida, Olívio Montenegro e, principalmente, com Gilberto Freire, que muito o influenciaria. Em 1935, transfere-se definitivamente para o Rio de Janeiro, onde colabora em alguns jornais e exerce cargos diplomáticos. Elege-se para a Academia Brasileira de Letras em I 955. Morre no Rio de Janeiro, em 12 de setembro de 1957.
José Lins do Rego apelou constantemente para as recordações da infância e da adolescência para compor seu ciclo da cana-de-açúcar- série de romances de caráter memorialista que retratam a Zona da Mata nordestina num período crítico de transição: a decadência dos engenhos, esmagados pelas poderosas usinas. Em todo o ciclo, o cenário é o engenho Santa Rosa, do velho coronel Zé Paulino, avô de Carlos de Melo (o narrador de Menino de engenho, que, em muitas passagens, é o próprio José Lins do Rego). Além deles, povoam o Santa Rosa o tio Juca, os moleques – filhos dos empregados – que vivem soltos pêlos engenhos e brincam com os meninos-filhos dos proprietários na ingênua igualdade da infância, apesar dos preconceitos dos adultos:
“- Você está um negro, me disse Tia Maria. Chegou tão alvo, e nem parece gente branca. Isto faz mal. Os meninos de Emília já estão acostumados, você não. De manhã à noite, de pés no chão, solto como um bicho. Seu avô ontem me falou nisto. Você é um menino bonzinho, não vá atrás destes moleques para toda parte. As febres estão dando por aí. O filho do Seu Fausto, no Pilar, há mais de um mês que está de cama. Para a semana vou começar a lhe ensinar as letras.”
O próprio José Lins do Rego, no prefácio ao romance Usina, pinta um excelente painel desse ciclo em toda a sua evolução:
“Com Usina termina a série de romances que chamei um tanto enfaticamente de `ciclo da cana-de-açúcar’.
A história desses livros é bem simples: comecei querendo apenas escrever umas memórias que fossem as de todos os meninos criados nas casas-grandes dos engenhos nordestinos. Seria apenas um pedaço da vida o que eu queria contar. Sucede, porém, que um romancista é muitas vezes o instrumento apenas de forças que se acham escondidas no seu interior.
Veio, após o Menino de engenho, Doidinho, e em seguida, Bangüê. Carlos de Melo havia crescido, sofrido e fracassado. Mas o mundo do Santa Rosa não era só Carlos de Melo. Ao lado dos meninos de engenho havia os que nem o nome de menino podiam usar, os chamados `moleques de bagaceira’, os Ricardos. Ricardo foi viver por fora do Santa Rosa a sua história que é tão triste quanto a do seu companheiro Carlinhos. Foi ele do Recife a Fernando de Noronha. Muita gente achou-o parecido com Carlos de Melo. Pode ser que se pareçam. Viveram tão juntos um do outro, foram tão íntimos na infância, tão pegados (muitos Carlos beberam do mesmo leite materno dos Ricardos) que não seria de espantar que Ricardo e Carlinhos se assemelhassem. Pelo contrário.
Depois de Moleque Ricardo veio Usina, a história do Santa Rosa arrancado de suas bases, espatifado, com máquinas de fábrica, com ferramentas enormes, com moendas gigantes devorando a cana madura que as suas terras fizeram acamar pelas várzeas. Carlos de Melo, Ricardo e Santa Rosa se acabam, têm o mesmo destino, estão tão intimamente ligados que a vida de um tem muito da vida do outro. Uma grande melancolia os envolve de sombras. Carlinhos foge, Ricardo morre pelos seus e o Santa Rosa perde até o nome, se escraviza.”
Esses títulos foram lançados entre 1932 e 1936. Entretanto, em 1943, José Lins publicaria um romance que é considerado síntese de todo o ciclo: Fogo morto, ponto máximo de sua obra.
Além do ciclo da cana, José Lins do Rego abordou outros aspectos típicos da vida nordestina, como 0 misticismo e o cangaço, presentes em Pedra Bonita e Cangaceiros. A provável fonte temática, bem como a oralidade da narrativa, nesses casos, teria sido a literatura de cordel, como afirma o próprio autor:
“(…) Os cegos cantadores, amados e ouvidos pelo povo, porque tinham o que dizer, tinham o que contar. Dizia-lhes então: quando imagino meus romances, tomo sempre como modo de orientação o dizer as coisas como elas surgem na memória, com o jeito e as maneiras simples dos cegos poetas:’
Água-mãe e Eurídice são os únicos romances de José Lins ambientados fora do Nordeste e, nas palavras do próprio autor, “desligados dos ciclos da cana-de-açúcar e do cangaço, misticismo e seca”.